Artigo para o Site da Granja, setembro de 2021

 

Numa sociedade movida à testosterona e adrenalina, homens e também mulheres se veem incansavelmente envolvidos num modo de vida agressivo e competitivo. Busca de desempenho é a tônica do dia a dia nas mais diversas áreas da vida, e as resoluções dos problemas são encontradas quase exclusivamente na base da força e da exaustão. Nesse contexto, é inadmissível uma performance menos que excelente seja no que for, do trabalho ao sexo, dia e noite, noite e dia.

Mulheres também são demandadas a ter “culhões” e a mover-se neste meio onde potência é confundida com dureza, arrogância, esperteza, sobrecarga de trabalho, produtividade etc. Para garantirem um mínimo lugar ao sol, sempre em condições inferiores a dos homens, e para se defenderem desse ambiente bruto, muitas vezes elas/nós também entramos no jogo sem perceber. E assim, podemos acabar nos tornando fêmeas caçadoras, amazonas que arrancam o seio, workaholics ou, então, ficarmos eternamente queimando sutiãs na praça.

Mas não nos enganemos: a sociedade da testosterona prometeu muito, especialmente aos homens, mas é capaz de usar e manipular sem dó quem a ela se entregue, para depois fazer o descarte com a mesma facilidade com que se descarta uma bituca de cigarro, esmagando-a sob a sola dos sapatos. O que num momento pareceu uma parceria vantajosa, lucros fenomenais a serem divididos, conquista de status e poder, vai-se mostrando um modo de vida subjugador e escravista.

Tarde demais perceber isso quando tudo o que se fez ou se conseguiu acumular apenas produziu uma vida sem sentido, vazia, sentimentalmente estéril, cansada e desprovida do que é verdadeiramente humano. Tarde demais também quando a saúde, física e/ou mental, se vai. Ou quando não se consegue mais permanecer excitado com nada, e nem antidepressivos, viagras, anabolizantes e “quetais” conseguem trazer de volta um mínimo de vitalidade e prazer, e na cabeça martela constantemente a pergunta “por onde deixei escoar o que eu tinha de mais precioso?”.

Pois se ainda houver algum tempo, talvez seja bom realocar projetos e estimular outras estratégias, alterando o estilo de vida atual adoecido, um dia adotado às cegas.

Pois a sociedade da testosterona deveria se curvar à ocitocina, para o bem de todas e todos nós. Em geral associada apenas às mulheres por ser responsável por funções durante o parto e na amamentação, a ocitocina, conhecida como “hormônio do amor”, é também produzida no corpo dos homens e fundamental para todo ser humano. Suas funções de prazer, relaxamento, bem-estar e positividade capacitam ainda atitudes como inclusão, aptidão de se relacionar e de cuidar, empatia, amabilidade, generosidade, cooperação, interioridade, tranquilidade, concentração etc., sendo estas qualidades essenciais à vida, grandes ferramentas que nos dotam de uma inteligência especial na resolução de problemas e fator fundamental para a saúde em geral. Como garantir que ela seja produzida? Isso acontece especialmente quando não há excesso de testosterona, e ao se ter contato com pessoas significativas, num olhar, abraço ou beijo, por exemplo, ao se realizar algo com prazer, no descanso e relaxamento, em ações que são benéficas para nós mesmas(os) e/ou para os outros, ao sentirmos segurança e conforto e, em quantidades ainda mais significativas, na hora do orgasmo.

Voltando aos homens, grandes protagonistas do modo testosterona de viver, se o que foi dito até aqui não convenceu você, sente-se, porque aí vai uma informação importante: até mesmo a tão valorizada performance sexual masculina não se baseia apenas em força e numa suposta e indefinida virilidade. Voilà, aqui também a ocitocina está presente e tem papel fundamental. Sabe como? Primeiro, mais indiretamente, ao reduzir o estresse e ansiedade, aumentar sensações de prazer e estimular os estados de intimidade, afeto, confiança e expressão das emoções. E, segundo, atuando em conjunto com outros hormônios na produção mesmo de desejo, ereção, excitação e ejaculação. Animador!?

Se você espera do seu pênis tão somente uma resposta física e autônoma que alivie sua angústia e medo de não conseguir uma ereção e reforce sua masculinidade, pode ir às prateleiras da farmácia. A sexualidade, assim como a vida, ficarão livres de envolvimento afetivo, vínculo e erotismo no mais bonito sentido do termo. Até sua intimidade estará esterilizada do que é humano. Mas se houver aí uma dose de coragem, é aconselhável baixar a guarda e buscar essa pouco conhecida potência “ocitocínica”.

Se quisermos sobreviver individual e coletivamente e, mais, se quisermos viver melhor, com certeza precisamos nos equilibrar. Mais ocitocina e menos testosterona é o que se faz necessário no momento atual. Certamente nossas vidas e o mundo se tornarão menos bélicos, áridos, antiéticos, seguros e positivos, recuperando vias de um cuidado mais inteligente e menos predador.

Que tal abraçar esse impulso!?

 

 

Iana Ferreira
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