Artigo para o Site da Granja, outubro de 2021

 

Não costumamos lidar bem com as finitudes, as grandes e as pequenas, que acontecem ao longo da vida, não é? Se um vaso quebra e se desfaz, é ruim. Se arranham meu carro novo, o carro novo e bonito deixa de existir, e isso também não é bom. Se a flor morre, se alguém querido se vai, se o fim de semana acaba, se a festa termina… nada disso costuma ser experimentado com muita tranquilidade, tampouco com alegria.

Claro é que quando coisas ruins se encerram é mais fácil. O namoro que já não ia bem, o trabalho que não oferecia boas condições, a casa que ficou pequena, o bairro que se tornou barulhento… quando se trata de algo desse tipo, um tanto mais fácil lidar com o “fim”, com mudanças e transições. E olha que, eventualmente, ainda assim pode surgir um certo desconforto e um apego pelo que era conhecido, pelo que havia se tornado meramente habitual.

O fato é que, embora seja a coisa mais natural e certa na vida, ver situações ou experiências findarem não é algo que encaramos com muita naturalidade. E os motivos são vários. Se algo que amamos termina – pode ser a vida de uma pessoa querida, uma experiência agradável, uma fase boa que vivemos –, claro que sentiremos falta do que nos fazia bem. Já no caso de coisas neutras ou até ruins das quais é difícil se desapegar, as questões podem ser variadas, como o fato de que mudanças dão trabalho, imaginar que o que virá pode ser ainda pior etc.

Quantas pessoas não evitam a todo custo terminar até mesmo uma relação que não vai bem pelo simples fato de não quererem ficar sozinhas? Perder um emprego, por pior que seja este trabalho, pode ser muito aflitivo se a perspectiva é ficar desempregada(o).

No entanto, não temos controle. Simples…

E quando não há como controlar, é preciso colocar nossa busca em outra direção. Se não controlo – ou não controlo totalmente – a vida, as situações presentes e futuras, os sentimentos e escolhas de outras pessoas, a própria finitude etc., é insano insistir nisso anos e anos a fio, sem parar para pensar a respeito.

Infelizmente este é o nosso estilo de vida atual. Somos uma sociedade mergulhada em ansiedade e depressão em grande parte porque vivemos uma realidade distorcida, imaginando que seria possível controlar tudo e buscando condições cada vez mais perfeitas, que estejam sob o nosso controle e jamais terminem.

Mas todos os dias, independente da nossa vontade, o sol se põe, a noite chega. Depois a noite termina, o dia recomeça. Pequenos ciclos se encerram e outros iniciam o tempo todo. Muitos deles nós nem percebemos. E tudo está lá, findando e começando constantemente, independente de nós mesmas(os) e da nossa vontade.

Dia e noite, inspirar e expirar, a semana, estações do ano, fases da vida. O aprendizado está aí, natural e disponível, em nossa experiência constante e cotidiana. Viver bem os fluxos e ciclos que a vida tem, ainda assim, talvez seja nosso maior desafio humano. Enquanto há vida há movimento. E sempre há muito o que aprender e desenvolver, que nada tem a ver com controlar condições externas, mas sim com desenvolver habilidades internas, disposições, entendimentos… Que as situações, fáceis ou difíceis, que nos colocam diante disso sejam sempre uma oportunidade para um passo a mais.

 

 

Iana Ferreira
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