Gosto dos dicionários de papel. Aquele livrão de folhas fininhas e letras miúdas, a bíblia de uma língua. Abarco a tecnologia disponível a meu favor, mas no mundo dos significados não dispenso o tatear. Com as ideias na ponta da língua e as palavras nas pontas dos dedos, ou vice-versa, as sinapses ficam mais divertidas. Porque quando procuro uma palavra, na verdade, estou em busca de várias ao mesmo tempo. E nem me dou conta disso.

 

O meu dicionário de língua portuguesa é antigo. Tem a capa meio solta, quase posso ver-lhe as entranhas. Serve-me bem, ainda. Para tirar dúvidas da reforma ortográfica, no entanto, lanço mão de um arquivo eletrônico. Escrevo uma palavra no passado e outra no presente. O futuro é verbete em construção.

 

Quero saber o que é grosa. Abro o volume aleatoriamente, para saber se devo ir avante ou não. De tanta consulta, adquiri uma habilidade; invariavelmente, caio na letra desejada. Sei que o L é mais ou menos na metade. Um pouco antes, o G. Um pouco depois, o P. Passeio pelas páginas; vou muito para frente, avisto alguma palavra nova e desconhecida, paro para ver. Atraso a tarefa. Também, quem manda querer saber que diabos significa grugutuba. Volto. Gê-érre, gê-érre-ó, gro, grosa.

 

A relação com o dicionário de papel é uma espécie de namoro e, como tal, há que se investir nele tempo e paciência. Flerto com as palavras e elas comigo; se perguntarem, “estamos nos conhecendo melhor”. Diferente do dicionário eletrônico, que é pá-pum, não tem preliminar. Vai-se direto aos finalmentes. É a rapidinha linguística, que também tem seus adeptos. Eu prefiro um demorado caso de amor com a língua-pátria, revisto e ampliado diariamente.

 

Em tempo: grugutuba é um tipo de feijão.

 

A grosa? Bem. A grosa vem depois de gronho e antes de groseira.

 

Imagem: Tony Alter

Silmara Franco
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