Gosto de observar escada rolante. Mas não qualquer uma. Só as inteligentes. E não o tempo todo. Só quando estou quieta. Como agora, tomando este cafezinho.
Funciona assim: quando não tem ninguém usando, a escada rolante se move vagarosamente. Para economizar energia. Basta alguém botar o pé nela, no entanto, para que ela role mais rápido. Quando a pessoa sai, não havendo mais ninguém sobre ela, a velocidade diminui novamente. E assim ela passa o dia. Movimentando-se mais rápido quando é necessário; poupando energia no resto do tempo.
Eu quero ser como a escada rolante inteligente.
Porque ela é esperta e sabe identificar a hora de agir. Nem antes, nem depois; no momento exato.
Eu não.
Passo os dias rolando velozmente sobre minha própria engrenagem, vivendo e revivendo coisas vividas e ainda nem vividas.
Gasto energia à toa, não me poupo.
Sempre acelerada, executo tarefas e penso pensamentos sem parar, nem mesmo desacelerar. Emendo fazeres uns nos outros, sequencialmente, tais os degraus da escada rolante.
Na esteira non-stop da imaginação sou capaz de ter diálogos mentais inteiros, antecipando conversas. E quando a conversa acontece, bingo. Não sai do jeito que imaginei. A pessoa não fala o que eu ensaiei para ela dizer, audácia da pilombeta! Perdi tempo e desperdicei energia tendo a pré-conversa imaginária. Fosse eu como a escada rolante inteligente, só me ateria à prosa na hora da prosa.
Com e sem estímulo, subo e desço, desço e subo. Às vezes, também rolo em elipses e não chego a lugar algum.
Sou um modelo obsoleto de escada rolante. E o cansaço manda a fatura no fim do dia, do mês, do ano. Não quero mais pagar. Nem rolar em vão.
Por isso gosto de observar a escada rolante inteligente. Há em seu movimento hipnótico uma inegável sabedoria. Que só consigo captar quando estou quieta. Como agora, tomando este cafezinho.
Foto: Simone Huck
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Parabéns, Silmara, excelente reflexão. Quando você “objetifica” seu padrão ansioso sob a forma do funcionamento inteligente da escada rolante, você engendra uma possível referenciação externa, através da similitude, para algo que não se curva e não se presta à observação e análise a partir de fora: a velocidade de nossos pensamentos. Seu texto me conduziu ao pensamento imaginativo de que, fosse nossa sociedade uma escada rolante, seria difícil alguém não cair da mesma, tamanha a velocidade…
Seus textos são delicados como o pouso de uma borboleta ou o beijo de uma criança, oferecendo aos leitores uma suavidade poética que desvela aos mais atentos um equilibrio possível entre sua prosa suave e atenta às pequenas belezas da existência e as reflexões existenciais de meus textos nessa nova fase da Entretexto.
Abraços!