Este texto também poderia se chamar: “inconsciente amazônico”, “nós, seres humanos, inconscientes e amazônicos”. Ou, na polaridade oposta: “Conscientes da Amazônia”, “Amazônia consciente urgente” etc. etc.

O fato é que nesses dias de difíceis notícias a respeito da nossa floresta, este patrimônio gigantesco, magnífico, riquíssimo em muitos níveis, reino de abundância e extrema diversidade e, exatamente por tudo isso, muitas vezes inimaginável, me peguei diversas vezes fazendo algum tipo de paralelo entre esses dois territórios fantásticos: o inconsciente e a nossa enorme floresta.

Vitais, vastos, mananciais de riquezas, partes essenciais da nossa existência… tantas vezes negados e negligenciados… Estes são apenas algumas aproximações que surgem de imediato para mim. Também é comum que se sobreponham a ambos o conhecido, o rápido, o que é de fácil acesso, o concreto, o objetivo, os negócios, os ganhos, os interesses egoicos e egoístas, o palpável, o mais simples e até o simplório. As consequências sempre são dramáticas.

Então, me pego pensando hoje que talvez o inconsciente seja a grande floresta densa que buscamos penetrar na psicologia (ao menos no entendimento da clínica junguiana e algumas tantas outras). Dá trabalho adentrar a floresta e também o inconsciente. É preciso cuidado e muita habilidade com a floresta e também com o inconsciente. E, apesar de tudo, eles estão ali, oferecendo-nos diversos elementos essenciais para a vida – oxigênio, energia, água, riquezas diversas – de forma abundante e generosa. Sem reconhecimento disso, eventualmente podemos colocar esses territórios e, portanto, a nossa própria existência em risco.

O fato é que normalmente transitamos por aí bastante inconscientes a respeito de quase tudo que nos cerca: do nosso bairro, nosso entorno, de como os alimentos, roupas e todos os produtos que consumimos chegam até nós, de como estão as pessoas com quem convivemos ou que encontramos, quem são, ao menos seus nomes. Numa dimensão maior, mais inconscientes somos. Mais inconscientes somos a respeito do planeta, da Amazônia em chamas, do plástico no fundo dos oceanos, dos buracos na camada de ozônio e assim por diante. E igualmente sabemos pouco de nós mesmos, dos nossos motivos, impulsos e camadas mais profundas. Andamos dormitando por aí.

Dia desses uma amiga fez um comentário sobre a situação da Amazônia em meio a uma conversa sobre um tema qualquer a respeito do bairro. A conversa foi algo como:

Alguém: – O supermercado x fechou, que tristeza!

Minha amiga: – Nossa, gente, com tantos assuntos sérios, como a Amazônia, precisando de atenção por aí, mal reparei nisso.

Entre concordâncias e também muitas indignações (sim, do tipo: “Ah, menos, né?”), voltei a pensar nessa relação entre nosso estado de consciência ou inconsciência e nossas prioridades e responsabilidades.

E então comecei a escrever este texto. Comecei sem saber para onde ele me levaria. Mas neste ponto percebo que desejo homenagear a todos e todas que trabalham, muitas vezes secreta e silenciosamente, com sua consciência humana a respeito do mundo e da humanidade. Que possamos ampliar a consciência que temos de nós mesmos, dos outros que nos rodeiam, do nosso meio ambiente, do futuro e das consequências dos nossos atos presentes. Que vivamos, falemos, pensemos e sintamos eticamente e comprometidos não apenas com o que é imediato e visível, mas com o que está além. Como seres humanos, podemos ir além do que meramente se apresenta diante de nossos olhos. Como brasileiros, desejo que possamos ir além do que se apresenta hoje para nós.

Que cuidemos da Amazônia, seus vastos recursos, suas populações nativas e indígenas. Que tenhamos governantes que nos representem bem nesta e em outras inúmeras grandes tarefas deste país enorme e complexo.

Que cuidemos também os nossos vastos territórios internos inexplorados, pois eles existem e têm efeitos em nossas vidas, quer os conheçamos ou não.

Que nosso bairro, os negócios que nele florescem, os empregos gerados, a água, o ar, os parques, a vizinhança, a segurança e o que nos rodeia mais imediatamente também progrida. Que façamos a nossa parte.

 

Dedico este texto a Ruth Sasaki, que peitou a conversa sobre supermercados vs Amazônia. E dedico este texto a meus(minhas) amigos(as) psicólogos(as) que cuidam deste vasto e desconhecido território interno do inconsciente. Parabéns pelo dia 27 de agosto, nosso dia, e por terem eleito na mesma data para todos os conselhos regionais e o federal chapas comprometidas com ética e boa governança.

 

Texto publicado no Jorna d’Aqui, Granja Viana, Cotia, SP, em 31 de agosto de 2019.

Quer ver uma história de incrível sincronicidade relacionada a este texto e ao assunto da Amazônia? Publiquei no Instagram da Entretexto. Para ser direcionado(a), clique AQUI.

 

 

Iana Ferreira
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